Ao propor mudanças significativas para o setor elétrico nacional, a Medida Provisória 1300/2025 abriu também as atribuições da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) para atuar em outros mercados, como gás natural e demais combustíveis, ando a ser chamada de CCE (Câmara de Comercialização de Energia). Essa ampliação de escopo, embora vista por fontes como um o bastante relevante, desperta ressalvas por parte de agentes do mercado.
Para Rui Altieri, que foi presidente do Conselho de istração da então CCEE e hoje preside a APINE (Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica), a mudança é vista como um processo normal. Ele destaca que a Câmara possui quadro técnico muito capacitado e que a decisão sobre atuar em outros mercados caberá à assembleia da associação, que é soberana.
Altieri cita como exemplo bem sucedido de absorção de atividades a transição da istração de encargos da Eletrobras para a CCE. Segundo ele, a entidade pode assumir novas atividades sem grande preocupação. Mesmo o fato de uma nova estrutura de governança da CCE estar pendente de aprovação na ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) e possivelmente precisar ser revista devido à MP, não é visto por Altieri como uma grande preocupação, mas sim como algo do dia a dia e manejável pelo setor.
Newton Duarte, presidente executivo da Cogen (Associação da Indústria de Cogeração de Energia) corrobora a visão positiva sobre a atuação da CCE no mercado de gás natural. “Considero positivo que tenhamos para o gás natural a centralização da comercialização na CCE”, afirma.
Duarte entende que o registro dos contratos e contabilizações realizados pela CCE são necessários e importantes para dar confiabilidade e segurança nas transações no ambiente de contratação livre do mercado de gás natural. No entanto, ele ressalta que a estrutura de governança para o gás natural deve ser mínima e integrada na estrutura de energia elétrica. Também avalia que a CCE deve ter uma relação estreita com a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), que regula o gás natural, assim como tem com a Aneel para a eletricidade.
Incerteza regulatória
Em contraste, a expansão da CCE desperta ressalvas para Luiz Eduardo Barata, ex-presidente do Conselho de istração da CCE, hoje à frente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, e também para Ricardo Lima, ex-conselheiro da Câmara e hoje consultor.
Barata vê a transformação da CCE como algo bom para a entidade, mas, no entanto, sua grande preocupação é com a estrutura da nova governança da organização, que vem sendo debatida há um ano e ainda não foi resolvida. Ele ressalta que a MP adiciona mais tarefas para a CCE, o que implicará em uma revisão obrigatória de toda a sua sistemática, mesmo sem os problemas atuais estarem solucionados.
Uma questão fundamental para o executivo é a incerteza regulatória para essas novas áreas. “Se irá a CCE operar no mercado de gás ou de carbono, quem a regulará?”, questiona.
Ele pontua que, por lei hoje, a CCE é regulada pela ANEEL para eletricidade. Para ele, essa questão da regulação para outros energéticos é muito mais ampla do que o que está escrito na medida provisória e constitui um motivo de preocupação.
Interferência do governo
Ricardo Lima também manifesta preocupação com a expansão da CCE. Segundo ele, a inclusão dessa mudança na MP teria sido um pedido do atual presidente do Conselho de istração da CCE, Alexandre Ramos, ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Ele levanta o risco operacional da CCE em ter capacidade para responder a todos esses desafios, argumentando que a implementação se ressente de e.
Lima questiona como a CCE, que já possui dezenas de atribuições, lidará com a liquidação de 250 mil, um milhão ou mais de clientes varejistas a partir da ampliação da abertura do mercado livre de energia, outro ponto previsto na MP 1300. As preocupações de Lima se concentram fortemente na governança da entidade.
Em sua opinião, o futuro formato do conselho proposto na estrutura que aguarda aprovação na ANEEL, tem mais interferência do governo federal do que a força dos agentes que formam a assembleia de associados. Lima também aponta falta de clareza sobre quem aprovará os procedimentos para a comercialização de outros energéticos, como gás e biodiesel.
Ele reforça a dúvida sobre quem fiscalizará essas novas atividades, mencionando que a ANP, por exemplo, não tem atribuição legal hoje para fiscalizar uma câmara de comercialização de energia nesse contexto. Embora a MP exija separação istrativa, financeira e contábil para as novas atividades, a estrutura de istração para isso não está definida.
ANEEL avalia impactos da MP
As mudanças na CCE propostas pela MP 1300/2025 também têm um impacto direto no processo de aprovação do novo Estatuto Social da organização na ANEEL, ainda pendente de aprovação. O diretor Fernando Mosna recentemente pediu vista no processo. Ele considera a MP um “fato superveniente”.
Ou seja, um evento posterior que pode alterar a situação jurídica. Mosna já via “ilegalidade” no estatuto aprovado pelos associados, o que motivou seu pedido de vista inicial. Com a nova redação dada à CCE pela MP, que abre suas atribuições a qualquer setor energético, ele precisará consultar as áreas técnicas e a procuradoria da agência para avaliar se as alterações exigirão que o estatuto seja novamente revisado ou se será possível uma homologação parcial.
A CCE também foi consultada pelo Canal Solar, mas não se manifestou até o fechamento dessa reportagem. Já a ABEGÁS (Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado) preferiu não se posicionar sobre o tema.
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