Energia solar distribuída: oportunidade histórica ou risco de retrocesso para o Brasil?

O Brasil tem condições únicas para se tornar um líder global em geração distribuída solar
4 min 54 seg de leitura
Energia solar distribuída oportunidade histórica ou risco de retrocesso para o Brasil
Foto: Canva

Nos últimos anos, o setor de geração solar distribuída no Brasil ou de nicho para protagonista na transição energética, refletindo avanços regulatórios, maior consciência ambiental e o facilitado à tecnologia. Ao contrário de uma visão pessimista, que aponta os desafios técnicos e burocráticos como entraves insuperáveis, é possível projetar um caminho de crescimento sustentável que preserve os ganhos ambientais, sociais e econômicos já conquistados.

A Lei 14.300/2022 representa um marco importante. Ainda que ela introduza a cobrança escalonada pelo uso da rede elétrica, também oferece uma transição justa e previsível até 2045. No entanto, é fundamental destacar que a ANEEL está com mais de dois anos de atraso no cumprimento do Art. 29 da referida lei, que determina que a Agência reguladora apresente estudos técnicos que quantifiquem os benefícios da geração distribuída para a rede elétrica.

A ausência dessa entrega prejudica o debate qualificado sobre os impactos e limita a formulação de políticas mais eficazes para o setor. Ainda assim, o modelo de transição previsto na lei permite que os consumidores e integradores se adaptem progressivamente, protegendo os investimentos já realizados e incentivando novos projetos com base em regras claras.

Ademais, medidas recentes da ANEEL para simplificar o processo de conexão em sistemas de menor porte são os positivos. Com ajustes técnicos adicionais e maior padronização entre distribuidoras, seria possível acelerar a integração de sistemas com segurança, sem onerar o setor ou comprometer a estabilidade da rede.

A crítica construtiva das entidades do setor, como a ABSOLAR (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), o MSL (Movimento Solar Livre), a ABGD (Associação Brasileira de Geração Distribuída) e o INEL (Instituto Nacional de Energia Limpa), é valiosa para aprimorar esses mecanismos.

O Brasil tem condições únicas para se tornar um líder global em geração distribuída solar. A irradiação solar favorável, os custos competitivos por kWp e a elevada tarifa elétrica fazem com que o payback médio de sistemas residenciais fique entre 4 e 5 anos, muito abaixo da média norte-americana. Com financiamento ível e apoio a projetos em comunidades de baixa renda, como o programa Energia Limpa, o setor pode democratizar ainda mais o o à energia limpa.

Para garantir um crescimento equilibrado, recomenda-se que o poder público e reguladores:

  1. Mantenham estabilidade regulatória, com revisões periódicas baseadas em dados de impacto reais e previsíveis;
  2. Aprimorem os processos de licenciamento e conexão, com digitalização, metas de prazo e maior transparência por parte das distribuidoras;
  3. Promovam certificações obrigatórias de instalações e profissionais, com incentivos à formação de mão de obra qualificada;
  4. Estimulem a pesquisa e desenvolvimento em smart grids e armazenamento, que ampliam a capacidade da rede absorver geração solar distribuída;
  5. Incentivem linhas de crédito verdes íveis para consumidores finais, condomínios e pequenos comércios.

Tais medidas podem garantir que a geração solar distribuída cresça de forma sólida, gerando empregos, atraindo investimentos e contribuindo para a segurança energética nacional. O foco deve ser na consolidação de um ambiente seguro, transparente e estável, que premie a eficiência e a inovação.

Uma forma rápida e eficaz de preparar o setor elétrico brasileiro para a consolidação da geração distribuída seria direcionar parte das verbas disponíveis dos programas regulados de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) e de Eficiência Energética da ANEEL para projetos voltados à inclusão do armazenamento de energia.

Esses projetos deveriam abranger tanto as soluções ‘behind the meter’ (em instalações consumidoras) quanto acopladas à infraestrutura das distribuidoras, criando as bases para que fontes intermitentes como a solar e a eólica em a atuar como fontes despacháveis. Tal transformação permitiria ganhos expressivos em qualidade da energia, segurança do fornecimento e estabilidade da rede, colocando o Brasil em linha com as melhores práticas internacionais.

É importante ainda desmistificar comparações imprecisas frequentemente feitas por entidades como a ABRADEE e até mesmo pela própria ANEEL, que afirmam que medidas como a cobrança do Fio B, a limitação por inversão de fluxo (ou como carinhosamente batizada pelo setor, “Invenção de Fluxo”) e as restrições de o à rede já ocorrem em mercados maduros como o dos Estados Unidos.

hahahaOcorrem, sim — mas em um contexto radicalmente diferente. Tomemos como exemplo a Califórnia: mesmo com mais de 1,8 milhão de sistemas fotovoltaicos instalados e mais de 12% de penetração solar na matriz energética do estado, as mudanças recentes na compensação tarifária (NEM 3.0) já resultaram na demissão de mais de 17 mil trabalhadores do setor solar apenas em 2023, conforme dados da CALSSA (California Solar & Storage Association).

Empresas fecharam ou redimensionaram suas operações, o que demonstra que, mesmo em ambientes maduros e tecnologicamente avançados, a adoção dessas medidas restritivas — como a cobrança do Fio B, a limitação por inversão de fluxo e barreiras técnicas para conexão — de forma mal calibrada podem ter efeitos colaterais significativos. Importar essas medidas para o Brasil — que ainda está em estágio inicial de penetração da geração solar distribuída— sem o devido cuidado é uma fórmula para retrair investimentos, gerar desemprego em massa, limitar o o à geração limpa e frear o avanço de um setor que tem potencial de inclusão social, sustentabilidade e de promover o desenvolvimento regional de forma significativa em todo o território continental do Brasil.

Adotar medidas restritivas isonômicas, desconsiderando a realidade de cada região, é matar o filho no berço, antes que ele sequer aprenda a falar.

As opiniões e informações expressas são de exclusiva responsabilidade do autor e não obrigatoriamente representam a posição oficial do Canal Solar.

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Eduardo Nicol
Diretor-geral de operações da Renew Energia. Executivo hands-on com mais de 30 anos de experiência na gestão de pessoas e projetos complexos nas indústrias de tecnologia da informação, telecomunicações, transportes, alimentação e energias renováveis. Formação em tecnologia da informação, especialização em gestão de projetos pela George Washington University/ESI, certificação PMP pelo PMI/EUA e, MBA em Gestão Empresarial pela FGV.

Uma resposta

  1. Parabéns pela reportagem e vamos lá. Aguardando a abertura para o Grupo B. Enquanto isso….Recentemente inauguramos projeto na área de energia compartilhada no Mato Grosso do Sul e mais 10 Estados no Brasil. O cliente recebe economia na conta de energia sem precisar instalar placas solares ou qualquer outro equipamento. Estamos buscando parceiros Empreendedores. Falar diretamente no watts 51984863327

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